Limpeza


Eu costumo fazer esta viagem uma vez por ano. É como limpar a minha mente, desligar-me de todas as responsabilidades, deveres e obrigações pertinentes ao meu cotidiano. Indo para um lugar onde ninguém me conhece, onde não preciso atender sequer uma ligação e ter de dar satisfação de algo, é simplesmente tranquilizante. Por parecer um sonho, eu tenho que acordar e, esse acordar é exatamente o retorno desta viagem.
Tenho realmente o costume de fazer isso uma vez por ano, indo para uma cidade que, apesar de ser ainda desconhecida a mim, já me parece familiar. Eu fazia isso sozinho, alugando um quarto de hotel e refletindo sobre as coisas que me decorreram durante um ano inteiro. Revendo minhas metas e meu presente, avaliando se o meu passado estaria influenciando negativa ou positivamente no acontecimentos que figuram em meu presente. Assim é esta viagem.
No entanto, neste ano, desta vez, eu resolvi levar uma pessoa comigo. Levei a pessoa que estava fazendo parte da situação, que estava intrinsecamente envolvida na minha vida durante todo aquele ano, me incentivando, me ajudando e me desestabilizando.
Eu tenho alguns amigos. Acho que não são muitos... Realmente não sei. Todavia prezo sempre o respeito e a lealdade desses. É exatamente por isso que eu não posso estar entregue a um desequilíbrio desenfreado. Os mais chegados me chamam de louco, maluco, dizem que não sou humano e algumas coisas mais. Realmente gostaria de não ser humano, sei lá. Não sei explicar muito bem isso. Mas o caso é que eu vivo na filosofia do “8 ou 80”, do Sim e do Não. Não tem meio termo. É como um técnico de futebol que anota tudo numa prancheta. Quando o jogo começar, ele não vai ter tempo de ficar olhando táticas, ele vai ter que sentir e decidir se vai ou não vai. Na vida não tem tempo para ficar no Talvez. Nós estamos aqui para fazer ou não fazer. É simples.
Voltando à minha viagem com a tal pessoa... Então foi assim... Parecia um filme de ação. Marcando horas, minutos, segundos para nos encontrar num local onde nenhum conhecido poderia desconfiar de nosso conluio na partida. Hehehe... Emocionante. Eu sempre vi o Tempo como o meu inimigo, mas o Capitão dizia para eu tratá-lo senão como um amigo, pelo menos com respeito. Infelizmente a minha paciência é curta... Talvez por isso eu tenha nascido com 8 meses. Não queria esperar mais um mês pra vir a este mundo completamente louco.
Tenhamos na mente que todos nós somos pecadores e assim viveremos tranquilos. Teremos na cabeça que o Não é certo, então buscaremos o Sim nesta vida. Teremos na mente que o Inferno nos espera, basta trabalharmos para alcançar o Céu.
Talvez eu não queira mesmo alcançar o Céu propriamente dito... Não sei... Mas o fato de viver a situação é o que me agrada. O fato de lutar e não de vencer ou perder. Pois quando perdemos, nos martirizamos encontrando respostas sobre os porquês da derrota. Quando vencemos, sorrimos, choramos, nos vangloriamos pela vitória, mas não demora muito tempo e colocamos o maldito troféu em cima da estante deixando pegar poeira. Não... Absolutamente não. Eu gosto é da luta... é do sangue e do suor por estar batalhando, por estar vivo. E por isso eu joguei fora várias oportunidades em estar numa vida cômoda, onde eu me deixaria ficar gordo numa poltrona em frente a uma TV de Plasma. Phoda-se o luxo besta. Isso não é viver, não é lutar.
Saio muito do foco do texto, não é? Não me importo nem um pouco por isso, porque gosto do que estou fazendo. Estou escutando um Bootleg do Judas Priest de 1983, um Show em Nova York para alguma TV, sei lá!
Então eu e a pessoa, a morena, pegamos um ônibus para a Central do Brasil, no Rio de Janeiro. E de lá pegamos um trem para a tal cidade. Gosto muito da cidade do Rio de Janeiro, embora não goste nem um pouco do “naipe” do povo. Povo de mente pequena, que prioriza muito a marginalidade em todas as facetas. Seja os “riquinhos” pagando os “cafés” para algum “cana” numa “dura”; seja os phodidos bancando de marginais por aí. Phoda-se também! O Inferno está cheio deles. Espero que lá embaixo tenha muito Heavy Metal. Aí sim será o tormento desse povo. Heh!
Chegamos à tal cidade e alugamos um quarto. Vivemos dois dias longe de tudo e todos, onde apenas telefonemas de um figurante veio a nos azucrinar. Bastou desligar o telefone e isso se resolveu. Nada como viver à vontade e por favor, não confundam isso com luxo. Viver à vontade é viver bem contigo mesmo. E por isso eu preciso desta viagem. Acho que todos precisam de algo assim. Isolar-se com seus problemas e torná-los soluções.
Rimos, conversamos, caminhamos, comemos e outras coisas mais que um casal deve fazer para não se fender. Foi realmente maravilhoso. Eu agradeço muito a presença dela, porque assim me foi concedido a oportunidade de equilibrar o meu desequilíbrio, de desequilibrar o meu equilíbrio; de normalizar a minha loucura, de enlouquecer meu estado normal.
Quando voltamos era tudo a mesma coisa concretamente. Ruas, pessoas, jeitos, peculiaridades. Mas eu estava “limpo”. Acredito que também tenha sido uma experiência muito boa a ela.
Assim eu limpo a minha estrada, permitindo com que eu corra feito um índio num carro conversível, pilotando de olhos fechados e cabeça inclinada para trás, sentindo o vento na fronte, sem mirar o horizonte como meu único objetivo. Pessoas e situações sempre aparecem em nossas vidas e por isso devemos relevar isto. Não podemos mirar um único ponto deixando que as situações que nos aparecem não fossem nada.
See ya! 

Comentários